quarta-feira, 12 de agosto de 2009


CLAVE DE SOL
Estou lamentavelmente convencido de que jamais regerei a Orquestra Sinfônica de Boston ou vestirei a camisa 10 da seleção. Há outras coisas impossíveis, como ganhar uma medalha de outro nos Jogos Olímpicos ou pilotar uma nave espacial com destino a Júpiter Etcetara.
Mas fora desse universo de impossibilidades, um homem que já passou dos trinta, não tem curso superior e não conhece uma clave de sol, ainda pode fazer muita coisa, inclusive chegar à Presidência da República ou assumir o trono de São Pedro, depende apenas de que estabeleça isso como meta e cultive, decididamente, as qualidades que levam a essas alturas.
Pouco importa o lugar onde tenha nascido ou o nome que lhe haja dado a família Joaquim Pereira de Oliveira, nascido com este nome em Caiçara, já regeu a Orquestra Sinfônica Brasileira, em Resende e já foi aplaudido, entusiasticamente, por dezenas de grandes auditórios. Eleazar de Carvalho já parou para vê-lo regendo e ilustres generais já lhe apertaram a mão.
Hoje, Joaquim Pereira reside no bairro de Miramar, em João Pessoa, com a mesma capacidade de trabalho, com o mesmo senso artístico, mas injustamente sem a mesma fama, quase esquecido de todos.
Desde que deixou o Exército, em 1954, nunca parou de trabalhar, mas já não dispõe de uma Banda de Música nem de quem grave suas obras inclusive uma sinfonia.
Contudo, não é um homem triste. Em 1971, a Câmara Municipal de João Pessoa conferiu-lhe o título de Cidadão do Município e alguns de seus dobrados como "Os Flagelados" e "Ten. Passos" continuam a ser executados pelo Brasil afora e no exterior.
Amigos íntimos de Capiba e Nelson Ferreira, entre outros grandes craques da música, o Capitão Joaquim Pereira sente-se profissionalmente realizado, embora, artisticamente, sonhe com a gravação de suas peças com a divulgação de suas obras, o reconhecimento que tem direito ainda, nesse caminho tão escassamente trilhado.
Um sonho que ele quase se recusa a revelar, metido que vive numa modéstia cheia de dignidade, mas um tanto desnecessária, tratando-se de quem se trata.
Faço este comentário para ele, na esperança de que outras homenagens lhe sejam prestadas, por sua agreste Caiçara, pelos setores culturais de sua adorada Paraíba, pelo próprio Brasil a que serviu como militar, 1933 a 1954, sem uma única punição sempre honrando a farda que vestia. De mim, pode-se dizer que jamais regerei qualquer Orquestra, que farei um gol no Maracanã perante cem mil pessoas ou chegarei em primeiro lugar e até mesmo em último, numa corrida de Fórmula-1. Coisa muito mais simples, como por exemplo, o Prêmio Nobel de Física, estou certo de que jamais ocorrerá.
Mas ninguém dirá que o Capitão Joaquim Pereira jamais poderá reger a Orquestra Sinfônica de Boston.
Jornalista Natanael Alves - Jornal "O Norte" 15/01/74.

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